Nem tudo o que parece é

11.7.09

De manhã ela traz uma máscara de boa-disposição: chega ao escritório e cumprimenta as pessoas com um sorriso saudável. Consulta a agenda, verifica a papelada e começa a trabalhar. Eu, do outro lado da sala, limito-me a fazer conversa de circunstância e a sorrir na mesma medida - a simpatia nunca fez mal a ninguém e a rapariga nunca foi mal-educada comigo; apenas chegou há pouco tempo e ainda não houve tempo para afinar o nosso relacionamento profissional.
Por vezes levanto os olhos do meu trabalho e noto-lhe um olhar triste, tão triste e perdido que fico com vontade de me sentar à sua frente, deixar-me de conversas de circunstância e perguntar-lhe se está tudo bem, ou perguntar-lhe mesmo em tom de confirmação "Não está tudo bem, não é verdade?"
Veste-se bem, não usa demasiados acessórios e o cabelo é luminoso, tão luminoso que já foi tema de conversa entre nós - a única vez que falámos um pouco mais. Confessou-me não usar produtos caríssimos comprados no cabeleireiro mas antes aqueles produtos brasileiros que quase ninguém se atreve a comprar, pelo menos as portuguesas, diz ela. O que é certo é que até eu já os procurei e não os encontro.
Não recebe telefonemas ou mensagens. Olha de vez em quando para o telefone e acho que se limita a confirmar aquilo que estava à espera - ninguém a procurou. Fica sempre com um semblante triste que automaticamente disfarça se nota que está a ser observada. Escreve muito num caderninho cor-de-rosa, com um lápis de carvão e desconfio que é ali que guarda todos os pensamentos. É bonita mas parece-me infeliz, ou então é só impressão minha que tenho a mania de tentar ver para além daquilo que me é dado a ver.
Qualquer dia pergunto-lhe pelos tais produtos brasileiros e quem sabe... talvez seja esse o mote para mais algumas conversas ou desbafos e quiçá, uma futura amizade.

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