o alcance dos turn offs

15.9.10

estava aqui a entrar no meu local de trabalho e vi um rapazinho à frente do carro. "este até marchava, deixa ver" - pensei eu - pele morena, penteado aceitável, camisa rosa, calças normais...mas o que é aquilo nos pés? mocassins tipo tods sem meias? esquece lá isso.
tods em pés de homem, escrever com erros ortográficos ou lols a meio de uma frase são turn offs completamente inultrapassáveis.
até porque estou apaixonada por ti, que não usas nada disto.

O alcance do incansável

14.9.10

Imagino-me numa multidão reconhecendo-te a voz. Estou mais para a frente e num impulso - que mais tarde me fará remoer horas, dias - volto-me para te ver. Era a tua voz e eu, anos depois, ainda a soube conhecer no meio de tantas. Outras vezes é o ver-te passar na rua. Ver-te bem, e tu nunca me veres. Tortura. Não gosto destes cenários e de vez em quando torturo-me com eles.
O contrário é que sim. Desfilo com boas botas, cabelo decente e cara civilizada, e tu parado no trânsito, dentro de um escritório, vês-me e sentes-me a falta. E eu não sei, nem saberei.
Queria que me reconhecesses a gargalhada em vez da voz. Desta vez, eu atrás, tu na frente. E eu a rir. Num segundo, ouves, viras-te e confirmas-me. E eu penso "Banzai!", que em sonhos penso japonês (ou sic, já não sei). E tu com a cara de tacho com que tinha eu ficado antes: "ah és mesmo tu e eu não queria estar a olhar para ti". Só que olhar descaradamente nunca foi problema para ti. A gargalhada, essa é que queria que me ouvisses. E se eu tenho rido! Não, não ía dizer "mas eu não rio...", que pensavas? Por favor, não afectas isso tudo. Já não. E eu não troco rir por ti. Já não.
Mas continuo a querer que me vejas e tenhas saudades. Mesmo que eu nunca o saiba.

O alcance da criação

10.9.10

Não sei o que se passa comigo, nem eles, os personagens que outrora tanto me atemorizaram ao ponto de me fazerem passar noites a fio a escrever as suas histórias sórdidas e por vezes mórbidas. Ontem ainda vivia aterrorizada pelas vozes que ouvia e que me enchiam a cabeça até me deixarem disfuncional para todas as rotinas diárias excepto essa, de lhes escrever as angústias e os terrores, os desejos e os amores.

Escrevi tanto durante tanto tempo, canalizei tanta coisa que hoje me sinto esgotada, paralisada. Ainda escrevo, muito pouco, mas nada a ver com a explosão orgásmica de outrora. Não tenho saudades desse tempo, e os personagens ainda lá estão, só que já não os sinto da mesma forma. Falam comigo e eu rio-me deles e já acho tudo banal (Gostas de sexo? Nada de especial! Fodes mulheres? Nada de especial! Fodes criancinhas ou animais? Nada de especial! Fodes cadáveres? Nada de especial! Queres atirar-te do prédio mais alto que encontrares porque achas que sabes voar? Nada de especial!)

Terei perdido o medo (de foder, de morrer)? Seria esse o meu maior (e único) impulso para a escrita? De onde me vinha tamanha ânsia, tamanho frenesim? Os personagens acotovelam-se e sussurram e olham tristemente para aquela que já não é a mesma de antes. Não sei se um dia voltarei a esse complexo esplendor, tornei-me amorfa (insensível) à dimensão humana de tudo aquilo que criei.

o alcance da cegueira

6.9.10

É tão mais fácil escondermos-nos das imagens que os nossos comportamentos possam transmitir aos outros do que olhar para o espelho e reconhecer que errámos. De repente, num belo dia, percebemos que alguém pensa que somos assim ou assado e, essa imagem, afinal não era a que queríamos que alguém guardasse, que nos pintassem, assim de rosto desvairado, cabelo desgrenhado e cara esborratada, mas foi essa a imagem que ficou, naquele momento em que dissemos o que não queríamos, cegas que estávamos de ódio, que espumávamos da boca como cadelas enraivecidas, dissemos barbaridades e mordemos em quem nos levou àquele estado de loucura temporário, absortas que estávamos em deitar cá para fora toda a frustração que nos corroía os ossos e nos esmagava as entranhas, nunca nos passando pela cabeça a imagem que os outros gravavam. Quando olhamos finalmente para nós, através dos olhos de quem nos viu naqueles preparos, não imaginamos, sequer, o quão ínfimo é o que vemos. Os outros, os que assistiram, guardam-nos ampliadas, com a voz amplificada a níveis de histeria de uma verdadeira alucinada antes da medicação diária. A vergonha da nossa própria figura deveria ser a linha que nos separa de repetições constantes da mesma figurinha, mas não, é mais fácil tentar enganar[mos-nos] os outros com a velha desculpa de que lhes fizeram a cabeça. Afinal aquele episódio em que te agredi fisica e psicologicamente foi fruto da tua imaginação e de uma alucinação colectiva de quem soube dele. Se me vês como louca, vês mal, sempre te disse que devias procurar um oftalmologista, ou quem sabe um neurologista, o louco aqui não sou eu, olha lá para mim e vê se tenho ar de louca. Isto? Ah... estava a cortar a carne. Achas mesmo que te estava a apontar uma faca?
Depois alisamos ao espelho os cabelos desgrenhados, limpamos a espuma do canto da boca e achamos que estamos com olheiras, tudo o resto um pesadelo que sacudimos para debaixo do tapete e esperamos que ninguém o levante e veja a merda que andamos a esconder, principalmente de nós próprios.

O alcance das Biancas

Um dia destes, fui atrás de um link: blogger que visito convidada em blog alheio, e eu atrás do apelo. Adiante, o post era crú e eficaz: a fidelidade, os amores mortos, matados, e o terceiro, o estranho, que desperta e ajuda em caso de marasmo.
Já vimos isto, não foi? Porventura, já o vivemos. Umas já ajudámos, outras já fomos ajudadas, outras ainda, nada, mas vivemo-lo. Se é bom? Não é o que nos ensinam, isso sei. Mas o que nos ensinam é uma demo do que vem a ser a vida, portanto esta é só mais uma. Não é o ideal, mas o ideal vai-se fazendo. Teorias são para os inertes, que se deixam ficar a ver passar o mundo.
O que interessa, o que me ficou, foi que na caixa de comentários fui a única a chegar onde o post chegava - o alcance, lá está -, tudo o resto de desfazia em tretas convencionais "vai desculpar-me, mas amor não é isso", "traição é traição" e outras cordelices saídas das Biancas e Arlequins. Não era de amor que se falava. Ou era, mas por quem o vive e sabe o que pode acontecer. Ou então, refugiados nas Samantas, não o sentem, nem vêem. Comentei, fui atendida "nós cá sabemos, não é?". E é.
E outra vez, a frase de uma amiga de muito tempo, aos vinte anos a concluir: "Abóbora, - ora abóbora, que me ía saindo o meu nome - as bimbas é que são felizes".