Chegou o Verão e ela nunca falava das suas férias.
Ao almoço, mais uma vez, perguntei-lhe "Então, para onde vais de férias?" Não levantou os olhos do prato "Não vou para lado nenhum" e senti que aquela garfada de comida foi engolida a custo, como se tivesse medo que lhe fizesse mais alguma pergunta "Mas porquê?" Os olhos continuavam em cima do prato, os gestos tornaram-se mais rápidos e bebeu o sumo de um trago só "Não posso" e levantou-se com a desculpa que ia fazer um telefonema. Não ia. Saiu e puxou de um cigarro e eu, que nunca a tinha visto fumar, fiquei estupefacta e constatei, nesse momento, que talvez nunca a viesse a conhecer realmente - uns dias tão amável e faladora, outros dias tão reservada e soturna. Quase bipolar, diria.
Quando entrou sugeriu que fossemos tomar café noutro local e num passo rápido avançou para a caixa e pagou o almoço de ambas. Agradeci.
Em todo este tempo nunca falou directamente de si, disse-me apenas que tinha 33 anos, feitos no pior mês do ano - Fevereiro. "Não gosto do Inverno e Fevereiro é um mês que não se define. Custa a passar, sabes?" Não sabia, nunca tal tinha sentido. Aliás, nunca tinha ligado muito aos meses do ano mas fiquei a pensar no meu - Setembro - e acabei por constatar para mim própria que esse sim, talvez fosse o pior mês de todos - o dos recomeços, o que por si só, dá uma trabalheira.
Bebe sempre um café duplo, não lhe põe açúcar mas mexe o café como se o tivesse acabado de deitar. "Agora fumas?"
"Sempre fumei, a única diferença é que agora compro cigarros, antes fumava o fumo dos outros." Não valia a pena, aquele dia estaria com certeza a correr-lhe mal e desisti de lhe fazer este tipo de perguntas. "Vamos?" Fomos. O resto do dia foi passado em absoluto silêncio, apenas com as interrupções normais dos restantes colegas e chefes. Antes de sair, despediu-se com um até amanhã e naquele compasso de espera, entre eu levantar a cabeça da papelada e ela abrir a porta, senti-lhe as reticências na voz, como se quisesse dizer mais alguma coisa. Mas sorriu apenas e saiu.
Comments
3 Responses to “Tem 33 anos [parte III]”
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Não sei porquê mas também não gosto de Fevereiro.
5 de agosto de 2009 às 15:51É um mês esquisito, mais curto, com um número de dias variável e sempre frio! Presumo que sejam precisas ainda umas quantas voltas ao saca-rolhas para que essa sua amiga se resolva a dizer mais alguma coisa...
Pois eu, sempre que me apaixonei, foi em Fevereiro. Tenho um enorme carinho pelo mês em questão. ;)
6 de agosto de 2009 às 02:08Uma escrita leve, mas sentida. Uma história que cativa porque nos podemos identificar ora com uma, ora com outra personagem.E o "suspense" fica...permanece...
7 de agosto de 2009 às 14:34Gostei!
BShell
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